Na busca por respostas e, ao mesmo tempo, ser flexível, percebi que é inevitável me contradizer. Me digo coisas como “foque no agir, não nos resultados”, mas logo depois aceito que “o julgamento do que é melhor ou pior é precondição para a ação”. Incomoda, mesmo que seja uma contradição superficial.

Mas seria essa contradição de fato minha? Afinal, buscar por respostas, no meu caso, é um caminho automático que meus pensamentos tomam. Tomo uma decisão, certo de que representa quem eu sou, mas logo depois meus pensamentos ficam adentrando as vielas da incerteza. Me desfusionar deles, que mais parecem vira-latas famintos por garantias e segurança, é pré-requisito para entendê-los e rejeitar trilhas mentais sem saída, a não ser a de ser consumido por eles. Eu e você não somos nossos pensamentos.

São eles então que estão se contradizendo? Se for isso, que assim seja. Que deem voltas sem sentido pelas praças, já inabitadas, que passei, enquanto sigo procurando por bairros com vida. Dito isso, seria apenas o eu de hoje contradizendo o eu do passado? Há uma interpretação positiva da contradição que é a do estar em evolução, pois não é possível evoluir sem contradizer algumas velhas crenças.

“Me diga, homem, a contradição é ruim ou não?” Eu sei que, como humanos, tentamos ser coerentes com nós mesmos. Ao dizermos algo, tentamos manter nossa palavra e agir de acordo com ela a partir dali, bem como esperamos que os outros façam o mesmo, pois é o que nos dá alguma previsibilidade no tecido social. Porém, quando aquela palavra que demos não estiver mais em acordo com nossos anseios e com o momento presente, até que ponto vamos aguentar mantê-la?

Talvez a pergunta correta seja: qual contradição é ruim? Pode ser que seja justamente a que contamina o lençol freático sobre o qual caminhamos, encoberto e sob pressão de inúmeras camadas rígidas de asfalto, e não a dos cachorros de rua correndo atrás do próximo carro ou vasculhando as lixeiras da mente.

Aos cachorros, às vezes é possível oferecer cuidado. Dar um pouco de comida de qualidade, carinho e abrigo. Mas é impossível impedir que corram e que sigam seus instintos. Esperar que o contrário aconteça ou pior dedicar esforços para controlá-los, sem dar o próximo passo para atravessar a rua, é desperdiçar a vida.

Nos resta tentar observá-los com curiosidade e empatia, mesmo após sua natureza nos surpreender e nos morder. Enquanto isso, volto a dizer, não seria mal encontrar comunidades pulsantes, bairros inteiros que mesclam velocidade e praticidade com jardins para contemplação e reflexão. Nesses últimos, o tempo há de passar diferente, daria para andar descalço na grama e se ter conversas longas sem grandes certezas, onde discordâncias não causam fissuras, apenas novas placas para guiar o trânsito com menos engarrafamento.